Após 7x1, Seleção assistiu do ônibus à festa alemã, com gargalhadas e "golfe"
10/11/2016 14:09É inevitável falar no 7x1. O Brasil volta ao Mineirão nesta quinta-feira, contra a Argentina, dois anos e quatro meses depois de protagonizar o vexame dos vexames na semifinal da Copa do Mundo, contra a Alemanha. Uma tarde inesquecível não só para jogadores e torcedores, mas também para quem trabalhou no estádio no dia 8 de julho de 2014.
Voluntários, seguranças, pessoas encarregadas de alimentação, transportes, absolutamente todos tiveram suas rotinas afetadas pela enxurrada de gols alemães. Trabalharam, sofreram, mas carregam histórias para o resto da vida.
Algumas eles contaram ao GloboEsporte.com, como, por exemplo, o abatimento no rosto dos jogadores da seleção brasileira, sentados dentro do ônibus depois da derrota, diante dos alemães, eufóricos, conversando e brincando de golfe metros adiante, como mostra a foto (sem foco) abaixo, afinal, não era uma área em que voluntários costumavam fotografar.

REQUINTES DE CRUELDADE
O protocolo Fifa, definido por um dos voluntários como “cheio de ‘nhém-nhém-nhém’”, determinava que o ônibus da Alemanha teria que deixar o Mineirão primeiro, e logo depois o do Brasil. Só que o 7x1 e a classificação para a final da Copa esticaram a festa no vestiário. Enquanto os brasileiros, que desejavam sair dali o mais rápido possível, já estavam no veículo, na garagem, prontos para ir embora, no ônibus da frente havia alemães sem pressa alguma.

– O pessoal da Alemanha demorou a sair, o Müller, o Ozil e o Schweinsteiger ficaram do lado de fora do ônibus simulando, como se estivessem jogando golfe. Era uma brincadeira deles, ficavam rindo, e os jogadores do Brasil olhando de dentro do ônibus. Um jogador alemão me perguntou se eu imaginava que aquilo aconteceria, eu disse que eles eram melhores, mas que ninguém esperava 7x1. Eles eram muito respeitosos, mas estavam felizes, falando alto, enquanto o Marcelo entrou no ônibus super cabisbaixo, o Oscar até errou o caminho, ficou sem rumo, tive que dizer para ele onde era – relata Rafael Mazziero, voluntário que cuidava, na área de transportes, da chegada e saída das delegações ao Mineirão.

IGUALDADE SÓ NA CHEGADA
O voluntário também conta que, por alguma falha de condução dos ônibus, que percorrem vias diferentes, ambos chegaram juntos ao estádio. Sobrou para a equipe dele consertar. A delegação alemã ficou parada do lado de fora, sem evoluir, porque a equipe de transmissão da Fifa tinha que filmar os jogadores das duas equipes descendo dos ônibus para o vestiário.
– Tivemos que pedir para os brasileiros acelerarem, descerem mais rápido, para podermos liberar a Alemanha, que estava na porta – lembra Mazziero.
“FALA SÉRIO”
A garagem do Mineirão reservou surpresas antes, depois, e durante a semifinal. Como os veículos saem pelo mesmo portão que entram, é preciso fazer uma manobra pela rua, que pode levar cerca de 10 minutos. Como tudo estava tranquilo, a equipe antecipou esse processo, habitualmente feito no intervalo dos jogos. Estava 1x0 para a Alemanha quando partiram. O ônibus é intocável, local de altíssima proteção, por isso, a manobra tem a presença de agentes da Polícia Federal. Quando retornaram à posição de saída, cerca de 10 minutos depois, um dos agentes perguntou a outro:
– Quanto tá?
– 5 a 0.
– Fala sério.
– 5 a 0 para a Alemanha.
– Fala logo, p..., preciso trabalhar.
– Estou falando sério, está 5 a 0, c...!

Os quatro gols marcados em sete minutos levaram os agentes a uma discussão de proporções “cenas lamentáveis”. E não é propaganda. Um dos coordenadores que acompanhavam a manobra relata que só quando o agente abriu o Tempo Real do GloboEsporte.com e mostrou ao colega, ele acreditou, depois de palavrões e empurrões.

MICK JAGGER, SEMPRE ELE
O roqueiro dos RollingStones adquiriu fama de pé-frio durante a Copa do Mundo. O voluntário Michael dos Santos, que passava o dia inteiro no Mineirão, recebeu a informação pelo rádio de comunicação interna que Jagger estava na porta do setor VVIP, o mais pomposo, onde ficam as principais celebridades, mas sem convite, sem lista prévia, sem nada, para assistir à Brasil x Alemanha.
– Quando ouvi o nome dele pensei: tirem esse cara daqui! Mas não iriam barrar o Mick Jagger, né? E o filho dele estava todo uniformizado de Brasil. Precisava ter um aviso antes para entrar nesse setor, ele não tinha nada, mas sei lá como ele entrou – lembra Michael, que viu um veto de peso em outro jogo da Copa no Mineirão: simplesmente do atual técnico quase campeão brasileiro.
– O Cuca queria entrar na área dos VIPs, mas nem o carro estava credenciado. O coordenador falou para ele: “Você tem ingresso de arquibancada, mas aqui não vai ficar”. E não ficou.

UM DIA DE FÚRIA
A função de Michael, o voluntário, era transportar, num carrinho de golfe, pessoas de mobilidade reduzida até suas áreas de acesso. Num dos “tours” por fora do estádio, ele se deparou com um torcedor sendo seduzido pelo cambista.
– O cara estava bêbado procurando ingresso para ver o jogo, e o cambista falou que era semifinal de Copa, Brasil, jogo histórico, e cobrou 16 mil reais. O cara pagou! Fez um cheque! Ele deve ter muito dinheiro, mas eu não acreditei.
Michael ficou com o rosto do sujeito na cabeça, e enquanto fazia uma habitual vistoria pela arquibancada com sua coordenadora, a Alemanha fez 2, 3, 4 a 0, e uma revolta se iniciou, com muitos torcedores indo embora do Mineirão. E então, surpresa:
– Quando começaram a sair eu vi o cara, transtornado, gritando que pagou 16 mil reais para ver aquela merda, e meteu o pé num alambrado na saída. O policial viu e o prendeu. Imagine o dia do cara! Pagou 16 mil reais num ingresso, viu o Brasil tomar 7 e foi detido.

OS COPOS DA COPA E A TRISTEZA DE JULIO CÉSAR
O funcionário público Daniel Carneiro, 33 anos, dava apoio aos fotógrafos que ficavam no campo nos jogos no Mineirão. Apoio significa várias coisas, entre elas pegar água para os profissionais. Numa dessas saidinhas...
– Em certo momento do jogo, eu sai do campo e fui na entrada de acesso ao gramado onde tinha um freezer com água e isotônico para os fotógrafos. Só nessa brincadeira eu perdi três gols. Ouvia só a reação do estádio, foi coisa de cinco minutos. Fiquei muito tempo atrás do gol do Julio César também. Ele estava totalmente abatido, incrédulo, sem reação mesmo. Buscava a bola no gol como se fosse treino.

Daniel viu muitos torcedores indignados e vários copos voando em sua direção. Aqueles mesmo, temáticos, feitos para cada jogo. Alvo de desejo dos torcedores, eles viraram forma de protesto à medida que saiam os gols da Alemanha.
– Vários copos foram arremessados no campo. Levei muito copo na cabeça, nas costas (risos). Eu tirei mais de 200 do gramado. Vi muita gente chorando, clima melancólico – lembra Daniel.